17 de ago. de 2013

O Senador

Já tá bom o suficiente, dizia Bira. Mas seu assessor insistia em mais prática, mais aulas. Não, to pronto, cara. E foram.
Bira tinha sido abordado há 7 meses por um sujeito que se dizia representar o senador Otácio Café. Nunca ouvi falar dele e nem de você, mané. E tu tá atrapalhando minha cerveja.
Acontece que Otácio veio numa comitiva com outros senadores e politiquetes de menor cacife que iria fiscalizar as obras da copa pro ano que vem, quando viu Bira descarregando um caminhão de areia com mais 3 operários. Após o susto inicial, Otácio mandou um assessor seguir Bira e checar os antecedentes pra ver se dava pra contar. Tirando umas dívidas no bar e 2 prestações atrasadas de um fogão das Casas Bahia, decidiram que Bira era um cara bem decente.
Ficou estabelecido que Bira se passaria por Otácio em compromissos oficiais e aparições públicas por Otácio, enquanto este tirava férias num local paradisíaco  e deserto. E as despesas de viagem ficariam pagas por 2 funcionários fantasmas no gabinete. Então eu só tenho que fingir que sou bacana, falar afrescalhado e posso levar a vida do senador? Amigo, a gente devia ter se conhecido bem antes...
Não tinha família pra sentir falta dele. Os amigos sabiam que ele não era de ficar muito tempo no mesmo lugar. Posso sumir e ninguém vai procurar, cara. Fica tranquilo.
Bira teve aula com professores de boas maneiras, de inglês. Decorou a biografia do Senador. Era recém-viúvo, sem filhos. Ninguém muito próximo capaz de reconhecer maneirismos que cada indivíduo tem. Se aprendesse a se comportar como bacana e falar com demagogia, ninguém desconfiaria e poderia ter a vida que sempre mereceu.
O primeiro compromisso era com a liderança do partido, pra discutir o ano que entrava. Não podiam bobear porque era eleição. Pô, é só eu falar aquelas frases de fresco  que a gente treinou e tá tudo certo. Todo político é cheio de frase feita mesmo.
Já tinha imaginado tudo na cabeça, compromissos eleitorais, umas sessões num auditório grande pra dizer sim ou não pras leis, cortar faixa de obra, abraçar bebês e beijar mamães. Tudo que um político faz. O resto do tempo era boa vida.
A reunião foi um sucesso. Impressionou tanto a cúpula que fizeram grandes planos pra ele. Era jovem, tinha um grande futuro pela frente. O sobrenome ajudava, o avô do senador tinha sido um grande radical moderado durante a ditadura e ficou bem quisto por ambos os lados. O que seu neto carismático não seria capaz então? Falavam em presidência dali a 2 mandatos. E todos comentavam que nunca viram o senador tão simpático e eloquente.
Bira era só sorrisos. Bom ator, decorou bem as falas e sabia improvisar. Também sabia agradar, deixou em todos a certeza que ali estaria o elo da vitória do partido. Quase não precisou do assessor soprando no ponto eletrônico.
Apertou a mão de todos, faziam questão. O presidente do partido, importante deputado federal, vinha em sua direção pra ter uma palavrinha a sós com ele. Ganhou convite para um jantar com a família, promessa de vaga numa comissão importante dentro do senado, ministério se ele quisesse. Tudo certo, era só dar adeus e a farsa ganharia respaldo. Sim, Deputado, é uma honra jantar com vossa excelência. Podemos trocar telefone? O seu é Claro? Tenho bônus pra Claro quando recarrego mais de 5 reais. Foi desmascarado ali mesmo.

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